quarta-feira, agosto 17, 2005

O tempo não pára...

- Entre.
E entrou. Estava o senhor sentado, olhando uns papéis numa mesa.
- É você o rapaz que marcou de vir as 4?
- Sou eu sim.
- Olhe essa parede à sua esquerda. O que você vê?
- Tem um relógio. Respondeu Walter, estranhando um pouco.
- Pois. E o que esse relógio te diz?
- Ele diz que são 4 horas, 3 minutos e 20 e poucos segundos...
- Sim sim, mas o que o ponteiro te diz?
- ...
- Você não ouve? Ele diz ‘mais um mais um mais um’, mas na verdade quer dizer ‘menos um menos um menos’...

É mais ou menos assim a história que o Walter Salles conta, num documentário sobre Mário Peixoto, sobre a primeira vez que se encontraram, na casa de Mário. Achei tão lindo.

quarta-feira, agosto 10, 2005

Da raça dos desassossegados de nascença

Um fragmento da coluna da Martha Medeiros na revista Outra coisa.

“Desassossegados desconfiam de si mesmos, se acusam e se defendem, contradizem-se, são fáceis e difíceis, acatam e desrespeitam as leis e seus próprios conceitos, tumultuados e irresistíveis seres que latejam.”
“Desassossegados têm insônia e são gentis, lhes incomodam as verdades imutáveis, riem quando bebem, não enjoam, mas ficam tontos com tanta idéia solta, com tamanha esquizofrenia, não se acomodam em rede, leito, lamentam a falta que faz uma paz inconsciente.”

E pra fechar, uma frase de Brecth. Uma frase que deveria ser dita como uma prece.
“Que possa tudo aquilo que nos é habitual inquietar-nos.”


Que assim seja.

terça-feira, agosto 02, 2005

Sim, eu sumo. Mas sim, eu volto.

A vida anda interessante demais. Sim sim. Há tempos não vejo as coisas com um colorido tão ‘cores de Almodóvar, cores de Frida Kalo’. Bendita medicina!

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Andei me atualizando em espetáculos de dança. Momix e Nó, da Cia Débora Colker. Amei ambos. Momix é uma coisa mais plástica, puramente visual, mas interessantérrimo. Você fica querendo descobrir como os caras fazem aquilo tudo.
Mas o de Colker faz mais o meu estilo. Tem uma trilha sonora deliciosa e movimentos que parecem simples e improvisados, tudo tão natural e lindo. Vontade de saber dançar daquele jeito. No primeiro ato, aquelas cordas todas, um jogo de dominar e ser dominado. Aproximar-afastar-reaproximar. Nós, laços podem até parecer uma metáfora comum demais, mas funcionam bem perfeitamente quando se quer falar de relações entre pessoas. E no segundo, um aquário vermelho, cenário inspirado num bairro holandês de garotas de programa. Também há a dominação em cena, embora o enfoque seja bem mais duro. Todo o espetáculo é sensualíssimo e tem uma pontinha de melancolia. Ao meu gosto. Não teve jeito de não encher os olhos d´água.

segunda-feira, julho 18, 2005

Regras e afins

Tenho algum tipo de dificuldade com tudo aquilo que regula, que limita, que restringe. No meu mundo ideal, tudo é permitido. E eu vou vivendo assim, sem me dar conta de que a maioria das pessoas tem tabus. Cheias de julgamentos. Eu simplesmente não consigo agir “para o bem do conformismo”. Eu gosto do jeito que eu sou e é assim que eu vou. De coração limpo.

sexta-feira, julho 01, 2005

Quero qualquer coisa de seu

Despudorada
desregrada
destemida
desmamada
descoberta
desvairada

e te esperando.

quinta-feira, junho 23, 2005

É isso e não tem jeito

Gosto. De você. Do seu gosto. Do seu corpo. Do jeito que eu sou com você. Do jeito que me trata. Que me faz rir. Do jeito que anda. Leve leve. Como se pesasse menos que plumas. Meio garça meio felino. De um jeito que espreita, mas com graça. Gosto desse sorriso que me dá. Sacana. Maroto, nesse seu linguajar antigo. E lindo lindo. Gosto. De você. É isso.

terça-feira, junho 21, 2005

É tudo que tenho

"Se cada dia cai, dentro de cada noite,
há um poço
onde a claridade está presa.

há que sentar-se na beira
do poço da sombra
e pescar luz caída
com paciência."
(Pablo Neruda)

Paciência pra pescar um pedacinho de luz que seja. Um pedacinho que ao menos ilumine. Nada que seja (nada é tudo que temos). Que acreditemos em alguma coisa. Alguma coisa que faça valer a pena. Nada que seja.
Nada é tudo que temo.

segunda-feira, junho 13, 2005

A vida é cheia de som e fúria

A vida está sempre nos propondo superação. De medos, de preconceitos, de amores, de ilusões. Então ela perde a mansidão e se mostra inteira. Real. Sem qualquer máscara que a torne um pouco mais doce, não. Sem subterfúgios, sem disfarces. Real. Inegável. E precisamos tempo, para que tudo pareça mesmo real. Para descermos do sonho. Tempo. Para redescobrirmos o amor. Tanto o que sentimos como o que sentem por nós.

Dê-me tempo, vida.

Dê-me amor.

quarta-feira, junho 08, 2005

“Como é chato lidar com os fatos. O cotidiano me aniquila.” *

Como me aniquila essa vida parada, à espera do futuro. Vai me dizer que o amanhã começa no hoje; que se deve plantar antes de esperar a colheita... Sim, sim. Estou por dentro dos clichês. Não tenho dúvidas de que nada brota sem sementes. Mas o que é que há? Não posso ficar de saco cheio do período entre-safras? Não posso querer margaridas fora da estação?

Pois bem! Quero margaridas fora da estação! E se possível rosas, crisântemos e essas flores todas que eu não sei o nome!

*Clarice Lispctor, Água viva

quarta-feira, junho 01, 2005

Shall we dance?

Acho que é porque sou grande demais, falo alto. E tenho os gestos largos e a gargalhada frouxa. Acabo passando essa impressão de mulher crescida, segura de si.

Mas é que esquecem de olhar os olhos. Sempre assim, meio mareados. Sempre prontos pro choro. Mesmo que por um motivo qualquer, bobo que seja. Ou por uma coisa de todo dia que de repente reparo de novo, como se fosse a primeira vez.

Esquecem de olhar o entusiasmo fácil por o que quer que faça o coração bater mais depressa (ou até parar por um breve tempo). Como se só existisse o hoje. Como se nenhuma possível conseqüência pudesse fazer algo deixar de valer a pena.

Esquecem de olhar no canto da festa, aquela menina um tanto perdida, que ninguém tira pra dançar...

segunda-feira, maio 30, 2005

De repente assim, feliz

Ela usava um anel de borboleta e parecia estar feliz. Pelos olhos, pelo sorriso que parecia tentar esconder. Até mesmo pelos movimentos, tão seguros, tão leves. Eu a observava já há muito tempo quando ela percebeu. Tentei desviar o olhar, mas já era tarde. Viu que eu olhava e não me negou um sorriso. Um sorriso primeiro somente de lábios, depois aberto, inegável. Um sorriso que só faz bem. Dado assim, sem que se pedisse...

Foi tudo tão rápido que só depois, quando não a via mais, é que a reconheci. Ou me reconheci. Refletida num espelho de arranha-céu em pleno centro da cidade.

quarta-feira, maio 18, 2005

Porque não a hipocrisia?

Temos que ser sutis.
Sem denúncia, sem panfletagem no poema.
Não vá dizer que em cada esquina morre um homem
de fome, de bala, de outro descaso qualquer.
Não vá ser desagradável com o homem no sofá.

Deixa ele ler o jornal desse Brasil tão distante do seu.
Já basta o seu problema de pressão.
Deixa ele acreditar que no fim se é feliz.
Fazer de conta que sua vida faz alguma diferença.

Deixa ele viver um pouco a fantasia,
que a vida dura se anuncia
e não deve demorar.

terça-feira, maio 17, 2005

Post egóico

Não é amor. Acho mesmo que nunca foi. Pode ser outro sentimento qualquer. Menos nobre, mas ainda assim me prendendo a você. Talvez egoísmo. É, talvez. Não quero perder. Ninguém nunca quer. E te perdi. Perdi toda aquela sua dedicação e seus olhos não me olham mais da mesma maneira.

Ego. No fim das contas, tudo é ego. Se formos analisar todos os acontecimentos do mundo, desde o mais trivial ao estopim de uma guerra mundial, são todos motivados pelo ego. Ferido ou inflamado ou rebaixado... Enfim, ego. E esse meu ego, ferido como está, motiva uma guerra nuclear.

quinta-feira, maio 12, 2005

Ainda bem

Quanto existe pra gente ler no mundo, pra gente conhecer....Caramba, isso me dá uma angústia! Quando eu vejo o pouco que eu sei, o tanto que eu queria saber... Todos os livros na fila pra eu ler e mais os que eu pretendo reler... E as poesias que eu queria saber de cor... O que eu ainda quero conhecer de rock, de mpb, de samba, de jazz... As músicas do Paulinho Pinheiro que não conheço nem um terço. Tudo o que não sei de artes plásticas. E aprender de João Cabral, sem deixar de ler A vida bate do Gullar como uma oração. E me emocionar ouvindo pela milésima vez Olé Olá. E ainda tem o sol, o céu, as pessoas, a praia, o papo furado, o chope, a noite, a vista do forte de Copacabana... Ai, quanta coisa!

Ainda bem!

terça-feira, maio 10, 2005

Agora é pra mim.

Não quero mudar esse meu jeito de gostar do sol da manhã.
Ao ser surpreendida por uma forte chuva de verão,
quero sempre lembrar da infância e esboçar até um sorriso.
Talvez seja bom aprender a medir um pouco mais
a altura da voz, a dureza das palavras, a largura dos gestos,
mas que conserve sempre espontaneidade.
Que o tempo nunca me tire o prazer
de pegar vento nas mãos em alta velocidade na estrada.
Não quero conter a vontade de cantar e de dançar com gosto.
Quero o mesmo bom humor com as pequenas tragédias cotidianas.
E com a mesma intensidade de hoje, quero rir e chorar sempre.

Que eu seja isso que eu sou mesmo com rugas e dores nas costas.

sexta-feira, maio 06, 2005

Hoje é sexta. E sexta já é muito bom.

No meio do almoço surgiu um assunto sobre ter mais de um carnaval por ano. Na hora eu fui contra. Até porque todo mundo era a favor. Mas eu queria sim. Queria que hoje fosse carnaval. Queria a irresponsabilidade consentida. Queria o aval cristão pra fazer a merda que fosse. Queria desatinar, ver chegar quarta-feira e continuar sambando. Queria um pouco de sonho entre plumas e paetês.

Mas hoje é sexta. E sexta já é muito bom.

quarta-feira, maio 04, 2005

Invencionices humanas

Minha avó me veio com esta: a mais importante invenção de todos os tempos é Deus.
E eu pensando na roda, na penicilina, na esferográfica, na escova progressiva, sei lá... Nem me dei conta de que Deus é só mais uma invenção do homem. Desde priscas eras, sempre precisamos acreditar em algo maior, sempre procuramos proteção, amparo. Daí a idéia de Deus ter se disseminado com tanta força e por tanto tempo. Mesmo já tendo sido declarado morto por Dostoievski, Deus está aí, firme e forte, unindo e desunindo os povos.
Acredite você nele ou não, ideiazinha genial, hein?!

domingo, maio 01, 2005

Passou tanto tempo já. No entanto, ao te ver, um furacão estomago adentro. Fico sem ter o que fazer com as mãos. Procuro uma coisa interessante pra falar, qualquer uma. Falo do tempo e de uma possível chuva para as próximas horas. E você com um charme tão natural, toca o meu ombro e sorri. Aquele mesmo sorriso que por um triz não me enfeitiça mais. Aquele mesmo olhar que tem o mundo e que um dia foi pra mim. A gente se despede com um beijo no rosto, um quase abraço e a velha cumplicidade de quem já dividiu o mesmo quarto.

quarta-feira, abril 27, 2005

Pecado capital: Gula

Um camelô. Uma baiana diretamente da Rocinha, com um carregado sotaque carioca, oferece acarajé aos transeuntes. Seria só mais uma barraca vendendo algum tipo de comida, não fosse a comida o acarajé.

Aquele cheiro que lembra aquele gosto que saliva a boca. Remete à Bahia. Minha viagem à Bahia, onde o acarajé quente, muito quente foi o principal meio de subsistência do corpo. E agora, numa esquina em pleno Largo da Carioca no Centro do Rio, me invade esse cheiro de tantas boas lembranças.

Fosse milho cozido, churros, chocolate dos mais variados, resistiria. Mas esse cheiro e esse gosto me fazem esquecer as incontáveis calorias presentes naquele pequeno prazer que me espera.

Num rápido diálogo com a baiana da Rocinha se estabelecem os critérios da relação comercial de compra e venda. E cá estou num banco de praça, as mãos sujas, a boca suja, a consciência pesada pelos quilos a mais e uma felicidade indescritível que só um acarajé poderia me proporcionar.

segunda-feira, abril 25, 2005

Exercício de ser criança

Esse é o título de um livro (maravilhoso!) do Manuel de Barros. Aliás, o título do blog é também uma frase dele. Enfim, criança é bom, é maravilhoso, porque ainda não tem construído todo esse leque de conceitos que nós já temos. E assim dão às coisas, pra nós já tão conhecidas, funções e significados que fogem à regra geral. Daí a graça da criança. Daí ela ter essa facilidade de fantasiar a realidade.

Isso tudo porque foi entreouvido num petshop, uma menina escolhendo o único passarinho amarelo entre vários numa gaiola: “ Pai, eu quero aquele ali. O mais maduro.”

Recomeço

Deu vontade de ter um blog de novo. E eu "puft" fiz outro! Vamos ver no que isso dá!