terça-feira, novembro 21, 2006

Escuro

A noite leva o dia. Traz a escuridão, onde os olhos não são vistos e enxergam mais. Onde o silêncio é mais mudo e os ouvidos escutam mais. Onde se está só na companhia dos que dormem. E à noite, no escuro, não se existe pra fora do corpo. Nada existe fora do corpo. É todo o mundo interior que se revela.
E o escuro nos redime. Nos faz recíproca a paixão. Traz as soluções mais milagrosas. No escuro se revive o dia. Tira fora o imperfeito, ajeita um pouco o que se disse e nos saímos bem melhor.
E o escuro nos destrata. Nos mostra, impiedoso, a pior parte de nós. Cria problemas insolúveis. Traz à tona os piores sentimentos. Nos prende em insensatos pensamentos.
É assim a noite: sossega o dia, mas também traz seus demônios.

quarta-feira, novembro 08, 2006

Trechos

“Para percorrer os dias, as naturezas um pouco nervosas, como era a minha, dispõem, como os automóveis, de “velocidades” diferentes. Há dias montuosos e difíceis, que se leva um tempo infinito a subir, e dias em declive, que se deixam descer num ímpeto, cantando.”
(Proust em No caminho de Swan)

Diz o Millôr que uma boa duma nebulização acabaria de vez com essa angústia proustiana. Que o mal do cara era essa saúde frágil demais. (Ironia típica do Millôr, óbvio. Ele mesmo leu Proust exaustivamente. Ou melhor, exaustivamente não, porque Proust não cansa, segundo ele). Frank, personagem de Steve Carell em Pequena miss sunshine (filme imperdível, aliás), especialista em Proust, diz que o escritor abençoava todo o período em que foi triste triste, porque foram esses anos que o tornaram o que é.
E é mesmo assim. A gente cresce, se constrói nessas horas em que a vida é uma longa e desgastante subida. O resto é levantar a mão pro alto e sentir o vento.

segunda-feira, novembro 06, 2006

Espelho, espelho meu

O cabelo ficou ótimo depois do banho de queratina. Também com a grana que custou. Sorriso perfeito. Sempre foi meu ponto forte. Assim, saio bem na foto. Meio de perfil pro lado esquerdo. Levanta um pouco a cabeça pra diminuir o gogó. Não tem jeito, depois de certa idade, aparece esse gogó. Todo o resto ainda dá pra retardar com ginástica e tal. Mas o gogó... e olha que não descuido do pescoço. Ou ele se vinga, como diz vovó. Na certa, o dela se vingou. O erro também traz sabedoria. Não, mão apoiada no queixo não. Passa dos 40 e toda mulher tira foto com o queixo apoiado na mão. Truque batido. Ai, essa olheira é um problema. E olha que ainda dormi bem depois do lexotan. Também, enrolei e não fiz a máscara de pepino. Essa luz também não ajuda. O vestido caiu mesmo bem. Não fugi do preto. Não arrisquei. Garantido. Disfarçou o culote que é uma beleza. E essa barriguinha... se não ficar de perfil, nem aparece. Será que não é o espelho que engana? Acho que não... a dieta de proteína na última semana funcionou. To bem que é uma beleza.

Respira fundo. Abre a porta de volta ao salão.

quinta-feira, setembro 21, 2006

A maldição das 6 coisas

A Tata, do Ação e divagação, recebeu do WW do Megazona e me passou essa. E eu cumpro, claro.
6 coisas sobre mim. (Poderia dizer umas 1000, mas aí acho que ninguém agüentaria ler...).

1- Já comi, literalmente, a conta de um bar porque não queria que ele fechasse tão cedo. Isso depois de trocentos chopes, lá pelas 6 da manhã.
2- Já fiquei em coma, já fiz traqueostomia, já quase morri, mas estou aqui, vivinha. O que me faz sentir meio imune a todos os males.
3- Já larguei uma faculdade faltando 2 semestres pra acabar, pra desespero de papai e mamãe.
4- Já voei de asa delta. Lá da Pedra da Gávea, voando até a praia do pepino. E digo que ninguém pode deixar de fazer isso, porque é bom demais.
5- Já fiz xixi na praia de Copacabana em pleno reveillon, pra um público de umas 2 milhões de pessoas. E mais de uma vez.
6- Já me perdi na minha própria cidade várias vezes, por ser distraída e desprovida de senso de direção, em último grau. Sendo que em uma das vezes, pedi informação com sotaque paulista, pra fingir que não era local.

Bom, to voltando agora pro blogue, então deixo pras outras pessoas a missão de ‘amaldiçoar’ mais alguém, ok?

quinta-feira, setembro 14, 2006

Ponto de vista

Pra mim, acordar seis da manhã e não dormir de novo é insônia.

Como diz Rubem Fonseca: "Cada ponto de vista é a vista de um ponto."

segunda-feira, setembro 11, 2006

Reescrevendo

A poesia discute com um ar superior (dois pontos)
Coloco vírgula, ponto final ou
nada, como faria talvez o Gullar?

Aqui cabe um parágrafo.

Já aqui é outra estrofe.
E o poema no ponto, fica pronto.
Estuda, desmembra, confere a métrica e...
“Segue a linha dos pós-modernos”

Editado, classificado e publicado.
Serve pra isso e nada mais.

sexta-feira, setembro 01, 2006

Mentira santa

Era mentira. Mas falei mesmo assim. Fui dura. Quase grossa. Certas pessoas só entendem desse jeito. Se era mesmo o que ele queria ouvir. Se outra resposta não satisfaria seu ciúme besta. Cansei de negar. Confirmei. Estava sim com outro. E é você o corno dessa história. Ele quis detalhes. Saber como, onde, quando, porque. Essa espécie de masoquismo comum aos que são traídos. E eu não neguei satisfazer o seu desejo sádico, como nunca negava satisfazer nenhum dos seus desejos. Até como traidora, fui pra ele a mulher que ele queria que fosse. E inventei pra ele uma traição medonha. Cheia de uma paixão que ele nunca ousou viver. Sexo a luz do dia, no horário em que os consultórios dentários ainda funcionam. Toda uma lista de desculpas inventadas pra passá-lo pra trás. Cansei de dizer a verdade. Disse o que ele precisava ouvir. Menti para que ele acreditasse em mim. Ele agora pode confiar e somos felizes.

Grupo Inverso em 31-08-06

quarta-feira, agosto 02, 2006

Quase um ano

Falta pouco pra fazer um ano. Um ano de uma vida completamente nova, que me pegou de surpresa no meio das coisas planejadas. Eu pensei que muito ia mudar. Mas não. Algumas dúvidas a mais, talvez. Talvez um pouco mais de medo. As mesmas coisas por fazer. A mesma coragem (ou falta de). A mesma facilidade pra achar graça da vida. A mesma mania de achar que tudo sempre vai dar certo.
Mudou a forma, não o conteúdo. Eu não ando mais. Eu deslizo sobre rodas. Quanto mais o tempo passa, mais eu percebo que isso é um detalhe. Me dificulta bastante, é verdade. Mas não me impede de voar.